ENTREVISTA – MUSTANG (CARLOS LOPES)
A inquietação de Carlos Lopes é proporcional ao seu talento. Como um artista autêntico, desde quando fundou o grupo Dorsal Atlântica, nos anos 80, é até compreensível que Lopes não queira mais falar do passado. Seu foco é a atualidade e o futuro. Por isso, não causou estranheza que tenha pedido, quando solicitado a conceder esta entrevista, que não houvesse perguntas sobre Metal ou Dorsal Atlântica. É notório que Lopes ainda leva consigo a urgência e vontade que o caracterizou desde o começo de sua carreira e que, portanto, não estaria interessado no passado. E ele nos mostra isso não apenas com seu atual grupo, Mustang, mas também na revista O Martelo, que edita, e nos livros que escreve. Abaixo, Lopes nos fala daquilo que esperamos que fale: o presente e o futuro. Confira:
- Depois de mais de 20 anos atuando como músico e compositor, diria que o Mustang é a sua realização como artista? Por quê?
Não diria que o Mustang seja minha realização total, porque a bem da razão, nunca me dou por satisfeito, já que, para que a expressão artística seja válida, ela deve se submeter ao momento, ao ato da criação. Cresci, amadureci e minha arte também. Não me reconheço como o adolescente que começou a tocar há 26 anos. Aquela é outra pessoa, tenho orgulho de quem sou hoje, não me importo com o passado. Me sinto mais um artista e menos um músico. Tocar é bom, mas de músicos o mundo está cheio, de artistas que se doam ao seu trabalho, que fazem da arte da comunicação a sua essência, há muito poucos. Meus trabalhos, sejam musicais ou literários, precisam se adequar às necessidades do meu momento, às descobertas, percepções e revelações pessoais. Se alguém me dissesse, no início dos 80, que em 2010 eu estaria gravando e criando, de forma totalmente independente, teria dado uma risada estrondosa.
2 – O Mustang lançou recentemente seu quarto álbum, Santa Fé, que, segundo você, é uma Opera Rock. Esse tipo de abordagem está rareando cada vez mais no mundo da música. Acredita que falta um pouco de “arte” no Rock praticado atualmente?
O CD Santa Fé foi lançado juntamente com a revista O Martelo, em 2009. E a ideia nasceu de uma história engraçada. Estava na redação da revista Rolling Stone, em São Paulo, e um dos jornalistas me falou: “Não tem nada mais morto do que CD e revista!” Tive um insight instantâneo: “Já sei o que vou fazer: ressuscitar os mortos. Lançarei CD e revista e ainda por cima juntos!” Sobre a questão da arte, debato esse assunto há anos com amigos, jornalistas e fãs de música. Não possuo a verdade definitiva, mas tenho a verdade de quem cresceu, acreditou e não se submeteu às agruras do meio ambiente. É importante sobreviver da sua arte? Claro que sim, mas a que preço? O preço depende do tamanho do cérebro e da alma do indivíduo. De fato, não há arte na música há anos. As bandas cover são a prova disso. Música virou apenas um produto, nem pior nem melhor do que um detergente, um lava louças. Se antes valia a criação, hoje o que vale é manter o seu lugar no mercado, um lugar que te garanta a sobrevivência, como se música fosse um emprego público. E por falar em público, ele também é culpado pelas escolhas, não só os músicos ou a imprensa. E a solução? Educação, simples assim. E educação é necessidade, não tem nada a ver com a vontade da elite, essa mesma elite indecorosa que comanda esse País desde a descoberta.
O formato de Opera Rock do Santa Fé foi escolhido para que eu pudesse contar uma história com início, meio e fim. Todas as letras são biográficas, falam de amor, traição, mentira, paixão, morte, doença e separação, com um humor negro que permeia toda a obra. O Santa Fé é um disco que, pessoalmente, me fala muito, o primeiro que pude dar um passo na criação de um verdadeiro estilo próprio, a MPR (Música Popular Roqueira) e me afastar do som mais setentista dos discos anteriores. O Mustang, passo a passo, será como foi determinado desde o início: uma banda de canções, sejam rock, funk, soul, psicodélicas ou MPB.
3 – Fora o Mustang, você também escreveu livros, além de manter uma revista eletrônica sobre cultura (O Martelo). Muitas vezes você declarou ser incompreendido por fãs e críticos. Acredita que, com todas essas atividades, você finalmente conseguiu se fazer entender?
Outro dia li algo na internet assim: “O problema do Carlos é que ele amadureceu…” Ou seja, o certo deve ser falar tudo errado, se embebedar, trair sua mulher, não estudar e tocar a mesma música que você compôs com 18 anos? Por que posso me aborrecer com algo que não me pertence? São apenas graus diferentes de percepção, mas para que me
entendam, é necessário um pouco de esforço, de abstração, como também não dá para eu negar os livros que li, as poesias que me emocionaram, os museus que me fizeram chorar, as igrejas que tocaram minha alma, os filmes que me mudaram.
Disponibilizar meus escritos on line, que antes eram editados em publicações convencionais, é parte desse processo de mostrar como penso, como reflito, quem sou. O Martelo é um espaço para discutir assuntos que me interessam e que, se puderem interessar aos leitores, teremos feito um link do bem, positivo.
Meu último livro se chama O Segredo J e é uma espécie de Código Da Vinci somado a um humor bem crítico. Fiz uma pesquisa séria em 5 anos sobre as mortes de diversas personalidades do Rock e da política, como John Lennon, John Kennedy, Getúlio Vargas, Jimi Hendrix, Janis Joplin, Juscelino Kubitschek, entre outros. O que pude comprovar é que as mortes, ou assassinatos, parecem ser obra de um mesmo mandante, uma organização que refreou o fortalecimento da contracultura e de ideais libertários a partir da Segunda Guerra Mundial.
Em outubro de 2009 já está sendo composto o novo Mustang, o quinto trabalho da banda e certamente mais livros estão a caminho.
O mercado absorverá esses trabalhos? Seria ótimo, será ótimo.
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Esta entrada foi publicada em outubro 27, 2009 às 7:26 pm e é arquivado em Entrevistas. Tagged: Carlos Lopes, Carlos Vândalo, Dorsal Atlântica, Livro, Mustang, O Martelo, O Segredo J, Opera Rock, Revista, Rock, Rock 'n' Roll, Santa Fé.
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